segunda-feira, janeiro 31, 2011
# Peço Desculpa,Porto, 29.01.2011 #
O cheiro mantém-se horas a fio depois de termos passado lá. Não se sabe se no corpo ou na memória. Não só o cheiro intenso a podre, nauseabundo, mas o cheiro a gente que não vimos.
Dizem que vieram de Leste - 30 pessoas de uma mesma família, mais 13 não se sabe de onde. Talvez tenham lido sobre os prémios que algumas autarquias portuguesas coleccionam, pátria de bons costumes em integração de imigrantes. Talvez tenham acreditado. Depois isto: barracas, lixo, plásticos a improvisar tectos e paredes, colchões entre as ruínas, ruínas entre tudo o que vemos.
Uma e outra vez já nos cruzamos com eles pela cidade, de mão estendida nos semáforos. E então ignorámos. Não o ignorar egoísta, o ignorar inchado de razão - não se vai para outro país para isto
(e ainda o cheiro, não se sabe se no corpo ou na memória)
Se por um momento a razão desincha, de novo o raciocínio a fazer força: provavelmente nem querem ser ajudados.
(“Tanto é o que precisamos de lançar culpas a algo distante quando o que nos faltou foi a coragem de encarar o que estava na nossa frente”)
Talvez seja verdade. Ou talvez não. Tanto pode como não pode. Não queríamos estar ali, mas já não podíamos não estar ali. A mão estendida no semáforo, é possível que o regresso a casa, à noite, seja para estas ruínas, já perto de onde o Porto deixa de ser Porto. Já muito perto de onde o Homem deixa de ser Homem.
Mariana Pinto Jornalista
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Um comentário:
Muito fixe. Texto e belíssimas fotos! beijoca
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