sexta-feira, outubro 13, 2006
# visita ao porto #
Não há fotografias simples. Mesmo as que se nos apresentam sem complicações aparentes. Mais de um século e meio depois da primeira apresentação pública da invenção dos senhores Niépce e Daguerre, mesmo em tempo de presença ubíqua da imagem, ainda nos surpreende a eternização de um momento operada pela luz numa superfície sensível. E se a morte do tempo, ao suspender o correr da vida, é angustiante e até diabólica, o mistério fotográfico adensa-se com o recurso a imagens especulares. Neste caso, há dois espaços de vida fixados, duas margens de um rio, dois pedaços da face da mesma mulher. À esquerda, a silhueta vulgar dos Clérigos remete-nos para o bilhete-postal turístico e para o lugar comum, uma banalidade cortada pela intrusão forte do vermelho denso dos lábios e do batom. À direita, a desmontagem do banal fotográfico acentua-se com a imagem espelhada de um espaço pobre que não vende postais a turistas vulgares, subitamente iluminado por um vermelho doce e sensual. E há, ainda, a suspensão da atenção na paisagem por parte da “visita”, momentaneamente dedicada a si própria e alvo, talvez inconsciente, deste múltiplo e rico “retrato” da cidade invicta.
Carlos Romero
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